Autorretrato - Estação

    É sempre nessa data, quando penso se existe em tudo isso algum sentido, se em algum momento encerraremos um ciclo. Parece que tanto tempo passou que chega a ser assustador ver que existem lugares onde nada mudou. Desprendi ali, assim, sem mais nem menos, essa parte que me faz inteiro. Olhei para a folha caindo ao chão, olhei para o vento mesmo sem conseguir vê-lo.
    Afundei  meu corpo na superfície que me tocava, como se não servisse de nada entender o que é matéria. Ri da minha própria cara. Continuei caminhando com serenidade, ainda que ouvisse ser falta de agilidade. Escolhi repousar naquela bela árvore.
    Quando me disseram para mudar tudo, para virar todos os ângulos, não sei se queriam realmente prever alguma coisa ou se queriam apenas me dizer para permanecer. Fiquei naquela respiração que parecia imensidão, mesmo no seu breve tempo.
    Olhei para o céu mudando de cor e pensei que não existe poesia mais bela, e acho que isso independe de mim. Será que ser independente é assim? Veio um afago molhado mo ouvido, era o cachorro de rabo desnorteado. Acomodei os desejos, as satisfações e os desesperos naquela contemplação, junto com o cachorro encostado no braço. Fechei os olhos e pensei: é sempre nessa data.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Autorretrato - Capítulo Vinte e Nove - Os pedidos lacrimejantes

Autorretrato - Capítulo Trinta e Seis - Permanência oscilante