Autorretrato - Nasci

     Acho que nasci para ser efêmera, esse pedaço de gente que não se tangencia, que cabe em muita gente e com ninguém caminha. Acho que nasci para ser um bibelô, visível em partes, supérfluo em suas extremidades.

    Acho que nasci em partes, faltando as artes, esculpindo defeitos intensos, para ser um pouco mais ameno. Acho que nasci de novo, com memórias de um todo que não me deixam ser, com a memória de um povo que não querem ver. Acho que nasci muitas vezes, e de tantas vozes, perdi a vez, encontrei tudo o que me desfez.

    Não achei que isso era poesia, achei que era só uma escrita, que talvez curaria alguma ferida, ou que revelaria alguma amiga. Acho que nasci com excesso de peso, faltou-me a leveza de deixar essas insanidades passarem, as crises existenciais se calarem.

    Acho que não me achei por aí, e isso me feriu, esculpiu todas as ânsias que me fazem correr, fugir de mim, fugir daqui. Acho que nascemos para não saber, para sermos talvez, e nos dividirmos em partes sem margens, para sermos uma eterna miragem. 

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