Autorretrato - Capítulo Quarenta e Cinco - Transparecer
As suspensões sempre foram uma multiplicidade de sentimentos que eu não consigo explicar. Com certa frequência meu salto quântico de crises me paralisa por segundos, dando-me um momento para recuperar os sentidos, para poder olhar para tudo o que mudou e fazer algum sentido. Nesse momento fica uma clara certeza de que não pertenço, à minha idade e ao meu tempo. Fica um feixe de luz que consegue anular tudo ao seu redor, e eu caio nos meus pobres e pequenos vinte e dois anos.
Depois
da pancada de compreender as questões humanas intraduzíveis e ilegíveis, vem um
excesso de sabedoria impotente que faz com que eu me sinta o cúmulo da
hipócrita estupidez barata. Transcender as coisas faz com que cada vez mais
você tenha menos palavras para dizer. Nesse ponto começa ficar difícil explicar
que você tem a exata incerteza, volátil e fugaz, e isso não te dá nenhum juízo.
Isso te deixa na beira do abismo com uma incessante vertigem mal acabada.
Pobre
da burrice que é a mais sábia de todas as culpas! Você começa a entender o
nada, a se preencher pelo vazio, e fica vergonhoso mostrar esse tipo de coisa.
Todos os possíveis adjetivos deixam de ter uma precisão linguística momentânea
para se tornarem constantes requalificações que você consegue enxergar em cada
tom de voz. Esse é o momento que você soa como um doido varrido.
Quando você acha um espelho para tentar se olhar é completada a transição: você não tem mais dedos para apontar, não tem formas para encontrar, não tem normalidades para te humanizar. E nesse momento, já nem importa qual será a porta.
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