Autorretrato - Capítulo Trinta e Sete - A outra face
Existiam momentos, pequenos sorrisos, doces olhares, carinhos comedidos, palavras suaves. Talvez fosse isso que deixava as coisas mais confusas, podia ser a proteção aparente, podiam ser as aparências sobreviventes. Para quê se deixar levar?! Aí você já se deixou, aí o bonde já andou, a vida já passou e a iminente morte já chegou.
Para
ela existia certa plenitude em se deixar morrer aos poucos, em mudar, em se
transformar. Essa passagem envolve perdas, nem de todo felizes, envolve ganhos,
nem de todo tristes, envolve concepção, que, embora reflexão, não é de toda
explicável, imaginável. Essas mortes não definem tempo, mas precisam dessa
maturação, necessitam certa obsessão.
Às
vezes a gente encontra facilidades que nos arrancam o couro na marra, que
coagulam as ideias em nossa cara. Por vezes a gente até entende, o gosto do que
encontramos vale a pena que de nós arrancamos. Mas, em momentos, nos perdemos na
obsessão desse desespero, buscando algo que nos diga o que queremos, que nos
mostre uma continuidade, até mesmo brevidade.
Com
ela havia certa felicidade, um prolongamento de insanidade, uma pequena
eloquência, que chegava a parecer demência. Tinham coisas das quais não se era
preciso, ela sabia; tinham maldades que existiam, ela via; mas havia coisas que
ela não queria conhecer, títulos que não lhe interessava saber.
Ela se desesperava com aquelas polaridades que conseguia ver em uma só face. Era assustador ver a bondade tão próxima da tortura inescrupulosa. Era inegável a complexidade, inviável aquela autoridade tão doída, tão moída. Havia um quê de autoproteção que escorregava em si mesma, que matava a si mesma porque insistia em viver.
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