Autorretrato - Capítulo Trinta e Cinco - A estranheza da suspensão

        Parecia pouco, e era pequeno, ao mesmo tempo em que desembolava proporções gigantescas, era assustadoramente minúsculo, sem ação, e, por momentos, parecia sem existência. Era forçado, era com consentimento, era com receio, e era desesperadamente sem medo.

        Aquela paz que ela fazia cobrir os olhos, o ar que ela fazia entrar com calma, o desespero que ela convidava para sentar e tomar um chá. Ela estava se obrigando a deixar as coisas passarem, sem pressa, sem delonga, sem susto e sem custo.

        Parecia tão pouco que ela se perguntava de fato o que era, se é que algo ali existia, pois tanta coisa ainda não mudava. Ela criou outra base para permanecer em pé, com muitas perguntas e poucas dúvidas, escolheu não puxar o tapete, só escolheu tirar os pés. Quis nem saber de certas coisas, nem imaginar certas moscas.

        Era estranho o todo. Eram estranhos os momentos de auge, a leveza que a deixava flutuando pelo mundo. Eram estranhos os baixos, quando o esterno se afundava no peito e se amarrava na garganta. Eram estranhos os nadas, onde tudo passava tão normal, que nada a consumia. Eram poucos esses dias.

        É inconsequente ignorar a queda, e era absurdo deixar os olhos abertos para se ver cair. Mas a queda é o exato momento em que a suspensão acontece, onde a desesperança toma conta para deixar a pessoa vazia. Com nada ela pode ficar só no momento, sentindo o vento aumentar enquanto se acaba o que estava no alto.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Autorretrato - Capítulo Vinte e Nove - Os pedidos lacrimejantes

Autorretrato - Capítulo Trinta e Seis - Permanência oscilante