Autorretrato - Capítulo Trinta e Dois - A queda da transparência

       "Até que ponto sou o que quero estando onde estou?! Quanto do mundo não me corta para escarrar nos meus ossos as escolhas que fiz, o jeito que me vesti, as cores que expeli, a tranquilidade que esqueci.

        Quantos de nós estão vagando por aí, procurando um lugar para pendurar suas esperanças, pois nesse mundo este é um fardo muito pesado para carregar. “Precisamos aprender sobre o viver, precisamos é sobreviver”.

        Esmagando-se para tentar tirar algo tão grudado em si, ela se esmagou demais, fez tudo se misturar numa dolorosa inflamação, que inchada, esmagava-a mais para dentro de si. Ela viu seus medos rirem do seu desespero, do seu desajeito ao tentar se manter de pé, e ninguém mais viu a força que ela fazia para continuar os dias. Ela viu o sarcasmo engolir seus trejeitos, as tentativas afundarem-na cada vez mais... Ela ficou sem teto e sem chão para tentar se levantar.

        Sozinha, foi tropeçando em si mesma, cambaleando na sua humanidade, escorregando na sua sensibilidade. Ela deixou que tirassem sua luz de si, que a matassem em cada olhar que lhe percorria as veias, que encontrava a fobia das suas ceias, a comida que não lhe descia, a palidez que lhe cabia, a estima que caía, sua vida que morria.

        Nesse momento tudo que lhe passava a mente era exatamente tudo que afligia o tanto que tentava, e lhe mostrava o pouco que conseguia, o nada que virava, o mundo que deixava. Ela via sorrisos cortarem a pele que perdia a cor para recobrir os segredos que ela não tinha. Nesse momento ela ficava esperando a perda de cor se tornar a transparência que a faria desaparecer dos outros, pois em si ela já não estava mais.

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