Autorretrato - Como se já não fosse uma narrativa... Capítulo Vinte e Três - O arregalo do beijo

        O mundo me abisma numa vertigem que não se move, numa certeza que me abala a gentileza. Permanecer está na vida, está na ida. A vida me abisma na sua carnificina, pois sabem o que me pedem? Que eu não fique, que eu esteja sempre saindo, que o conforto não me acolha, que eu vá e me foda. É, quanta poeticidade na exigência de uma autoridade. Por que me ensinaram o que ser se não me deixam escolher?! Pois é preciso minha cara, pra não ficar barato o se fode. Então retornemos à minha ode, cantarole querubim, só estou ajeitando as suas asas.

        Cante comigo a minha melodia, pois eu quero que assim seja! As minhas rugas amargas já não me deixam ter a voz suave numa doçura que aos meus olhos já não cabem. Só cabe a íris, a retina e a pupila meu doce pupilo que aprende comigo.

        Deixe essa premissa de ser integridade, te corto o umbigo seu enxerido! Mova o que me move, pois eu não tenho forças, e já não vejo crenças que me motivem. Fale comigo para eu saber que te escuto, mas não chore, foram algumas penas do seu lote apenas. Estava demasiado seu brilho.

        Só vejo uma coisa, só tenho olhos para uma coisa, uma escuridão que me rouba a alma pequeno querubim, uma escuridão que parecia não estar em mim, mas quando olho no espelho essa é a única coisa que vejo. Fale o que estou falando, pois minha boca está secando; vou molhar com um pouquinho do seu sangue, foi um pouquinho que restou, daquele seu brilho, lembra?!

        Ah não! Não fui eu que fiz o que está feito. Você se tornou escuridão. Não foi meu beijo, foi seu cheiro doce desejo. Fiz um travesseiro para o seu leito, você falou tão pouco pequeno! Isso já não importa, deite-se, pois já é hora meu anjo com sabor de amora.


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