Autorretrato - Capítulo Vinte e Um - As armaduras

        Era o mar de sensibilidade escondida; era a dor que fazia a cabeça latejar ao pensar nos intempéries que a faziam chorar; era a comida que voltava na garganta quando queria se curvar para dentro de si; era a fobia de si mesma; era a angústia de ter um depois; era tudo de ruim que estava liquidando-a por não conseguir mostrar nos reflexos de sua lascada armadura.

        Ela estava sem conseguir pensar, sem conseguir agir, só era possível seguir uma fina linha de compromissos e deveres que cabiam à sua carcaça; esta sim dava conta de sobreviver suficientemente. Nada mais cabia e nada mais se encaixava, parecia que ela entrara numa eterna convulsão que atordoava seus sentidos e fazia o mundo dormente ficar desfocadamente latente.

        Eram faltas e carências que ela se cobrava não ter, superar e esquecer. No fim, tudo parecia como os autônomos anos, existencialistas em suas crises nostálgicas, que convencionalmente, não podiam mais ser soluçadas publicamente, apenas escorridas em conformidade.

        Todas as crises, teoricamente catalogadas ou não, quando vividas intensamente, nos fazem lembrar da doída certeza de nossas escolhas, da caolha verdade que só nós podemos ver.

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