Autorretrato - Capítulo Um - O começo do fim
Enquanto a vida soava por entre sons gélidos, gotas orgânicas se
mesclavam com gotas viscerais, escarrando na noite o que os olhares do dia não
permitiam, gritando no desespero a melodia dos acordes escondidos, tortos,
desalinhadamente encaixados num fluxo maleável que se auto definia
tranquilidade, meio a seus surtos e contra-surtos.
As
unhas não eram a força que se esvaia na brutalidade dos objetos que as
arrancavam de si, mas as feridas que fazia para se curar, e fazer o que achava
inatingível e impossível: se alimentar da sua força para resolver os seus
problemas, sem ter que se apoiar no inexistente exterior; ser fiel a si, pois
eram suas palavras, seus pensamentos, seu mover, seus segredos opcionais
escancarados no que não viam.
Era só
o momento, e cada vez mais o momento; mais denso, mais profundo, mais a sua dor
composta de outros que não se viam nos seus olhos, na sua boca dilacerada, na
sua cara cortada, nas suas pernas arranhadas. Era só ela com seus conceitos
cujo ninguém compartilhava, ninguém escutava, porque ninguém sabia que
existia... e ninguém é muito pouca gente.
As
perguntas viravam reticências quando as afirmações eram indelicadas. Quem ia
imaginar que ela podia falar por entre palavras?! Era o absurdo! Todos sabiam
como ela falava... e todo mundo era muita gente para o seu gosto, que perdera o
senso de paladar perto das sanções, amigas próximas dos radicalismos - únicos,
reais, melhores e verdadeiros.
Não
era preciso ser o que não se queria, era só fechar os ouvidos e tocar uma
música bem alta dentro de si, repleta de diálogos e compreensões, onde o afeto
não precisava ser primo do respeito, mas eles podiam se entender sem, necessariamente, tornarem-se mais um relativismo infundado no mundo das verdades científicas.
Eram
coisas que, nesse caso, vinham naturalmente, por mais que repreendidas nas
tentativas de, engenhosamente, fazer acontecer o esquecimento naturalmente, as
fora-de-ordem retornavam para os valores tabelados, para os princípios
necessários nesse mundo sem música; compartilhado e idolatrado.
Suas
lágrimas escorriam e deixavam de escorrer por igual, assim como sua crença em
um cubo mágico unicolor, sem o racismo da diferenciação das cores, mas com as
particularidades dos ângulos de luz, que incidentes em cada um, tornavam-se, com eles, a sua
imagem peculiar.
Foram
só pensamentos que desabaram numa noite chuvosa, na sua auto presença e
companhia, servindo de testemunho, para si, de que era possível escrever as
suas regras, que aceitavam, necessariamente, outras regras que se dispusessem a
um clube sofista na versatilidade do presente que a todo momento se espiralava
com todo o resto.
Talvez não tenha sido um pequeno desfecho.
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